A espiritualidade, a oração e a transformação

Sidney Jorge • 24 de novembro de 2020

A espiritualidade, a oração e a transformação


A existência da pessoa humana é condicionada a um lugar no tempo e no espaço como refletiu-se em outro texto “Gratidão, humildade e serenidade” ¹ e para tal, a materialidade da presença física de alguém nos lugares que frequenta e interage com os outros, mostra a importância e relevância de cada pessoa. Mas há uma dimensão nas pessoas que escapam aos sentidos por estar além dos aspectos físicos, trata-se da espiritualidade. É sobre ela o declínio neste pensamento.


A espiritualidade tem implicações diretas no comportamento por motivos claros e, não é uma questão apenas de crença, pois se reduzir a matéria até às moléculas chegando aos átomos encontra-se grande espaço entre o núcleo e os elétrons. Conforme a estrutura molecular é característica de toda matéria e, cada ente humano, além da consciência, é também matéria então, tem em sua constituição a dimensão espacial dos átomos. Todo espaço pode ser um campo de possibilidades. De acordo com a física clássica, dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar no espaço2, por isso é relevante trazer a questão das possibilidades no espaço vazio e, ao mesmo tempo, colocar quando refere-se aos humanos, de percepção de dimensões, físicas e espirituais. A percepção da dimensão espiritual está além da física, sinalizando para outro estudo chamado metafísica sem ousar em qualquer reducionismo sobre o referido conceito e suas implicações metodológicas de pesquisas de definição do ser enquanto ser.


Colocado o terreno vazio para construção do tema, depara-se com o desafio de erguer a compreensão da espiritualidade. O que se deve fazer para interagir com a dimensão espiritual? Nada! Explico. É exatamente no parar de fazer coisas que encontra-se a experiência advindas do espírito, inclusive aquietar as ebulições presentes na mente envoltas na diversidades dos pensamentos. O relaxamento da mente e consequentemente do espírito, é que permite ao ente humano alcançar a dimensão espiritual e poder usufruir de todos benefícios da prática de exercícios espirituais, de meditação, de reflexão. O segredo é isolar, de certa forma, a mente por um determinado momento, dos “barulhos” constantes na vida diária. Outro elemento favorável é consequentemente o ar, o oxigênio e é interessante notar que trata-se de um elemento que não se vê é como se ocorresse um emaranhado dos átomos do oxigênio com o espírito. A cadência e a consciência da respiração acrescenta uma sensação ímpar ao processo trazendo um ambiente de profundidade enriquecendo os efeitos do exercício.



Ao chegar aqui entende-se a importância e necessidade de alimentar o espírito com os exercícios espirituais o que chamamos rotineiramente de oração. O modelo de oração está ligado à pertença de determinado grupo religioso. O destaque acima foi para provocar a atenção ao fato de que a espiritualidade é imanente ao ente humano, quem sabe a outras espécies também, sendo assim, pode ser que ela preceda a religião, ou a oração elaborada a partir desse ou daquele culto específico. Entretanto oração e espiritualidade estão intrinsecamente ligadas. É nesse contexto que apresenta-se o ciclo da espiritualidade para visualizar de forma didática como percebemos a estrutura da oração e seus efeitos.


A experiência espiritual inicia-se na oração, como já relatado, trata-se de um momento de parada dos afazeres para perceber elementos presentes e possíveis na dimensão do espírito. Quando a oração ocorre, ela traz em si um compromisso que nada mais é do que um despertar, talvez um choque da realidade. O acúmulo ininterrupto de tarefas impede e bloqueia as emanações possíveis do espírito. O comprometimento, precisamente, leva a uma ação concreta. Ação esta que pode ser orar mais, ou uma intervenção certeira a uma determinada situação. Toda ação provoca uma reação, ou seja, uma transformação, uma alteração que pode ser a volta da normalidade ou do que é razoável, libertador, justo dentro do respeito e consideração à criação, isso quer dizer que a transformação é feita em comunhão consigo mesmo, com os outros, com o cosmo e sobretudo com Deus, fonte infinita da espiritualidade. Importante destacar que após a comunhão o ciclo retorna a oração e novas fases são constituídas percorrendo o ciclo até voltar a oração novamente.


Alguns exemplos podem ajudar na compreensão do ciclo da espiritualidade. Digamos que uma pessoa está atordoada e sentindo-se extremamente infeliz afetada pelos intensos trabalhos e atividades que ela desenvolve cotidianamente sem tempo algum para si mesma. Um dia, por algum motivo, ela para e se põe a orar e desperta uma percepção diferente onde é convocada a dosar o tempo de sua forma de viver e, dedicar outro momento a cada dia para orar, nasce ai um compromisso. Então ela vai para a ação, parar um pouco e orar, logo começa perceber que sua vida e trabalho melhoram, ou seja, transformam. Em seguida passa a vê-los de forma diferente, vê as outras pessoas de sua rede de convívio e até mesmo a natureza de uma maneira diferente. Chegou-se na fase de celebrar a comunhão. Este ciclo é possível de avaliar também em casos de relacionamentos, dificuldade de perdão, de convívio, agressividades, no trabalho, entre outros. As pessoas orantes oferecem à sociedade uma realidade, muitas vezes, diferente, concreta, possível, próspera, apontando caminhos repletos de pontes e não de muros e barreiras intransponíveis que dificultam celebrar juntos a grandeza da vida e dos meios produtivos de vida digna que deveriam ser acessíveis a todas pessoas.


Na Bíblia há muitos apoios para exemplificar ousadamente o ciclo da espiritualidade. No entanto na história de Moisés³ no livro do Êxodo permite elaborar um pensamento ao encontro do ciclo da espiritualidade. Moisés faz uma experiência onde percebe a sarça ardente e o chamado de Deus e inicia um diálogo (oração) onde ele é convocado a liderar a libertação do povo Hebreu (compromisso). Em seguida ele vai ao Faraó propor a saída do povo (ação). Após a contrariedade do Faraó e muitas adversidades finalmente sob a liderança de Moisés o povo Hebreu põem-se a caminho passa pelo Mar Vermelho e continua sua jornada libertando-se da escravidão (transformação) tornando-se um povo único voltado as orientações de Deus e inicia sua comunidade (comunhão). O destaque é para a força da oração, do diálogo com o Divino, da percepção dos movimentos da espiritualidade.


A qualidade da parada de interiorização é o segredo da oração. Vale questionar para onde estamos direcionando nosso espírito. O barulho ao redor é alto, são muitos instrumentos de dispersão. Sem dúvida, voltar o olhar do espírito às redes sociais pode alimentá-lo de forma horrenda levando-o ao compromisso com ações destrutivas, corrosivas, corrompidas, provocando transformações que aprisionam fisicamente e inclusive o espírito. E, ao invés de comunhão universal reconhecendo a potência de irmandade em cada ser vivo, o que se apresenta, infelizmente, vem a ser a degradação, a separação, a desvalorização de toda espécie de vida, humana e do meio ambiente. Para onde estamos elevando ou decaindo nosso espírito? Depois de tudo, vale intuir uma convocação para distanciar um pouquinho, a princípio, e dedicar a oração, contemplar o belo que envolve cada mistério e cada epifania teológica, a buscar os benefícios do exercício da espiritualidade, do reconhecimento de que temos presente em nós uma rica dimensão pouco explorada e sobretudo ter fé de que podemos ser e nos transformar em pessoas melhores, reencontrando em nossa essência algo que os entes humanos têm, o poder da oração, a capacidade de diálogo com o Divino, o Criador. Oremos…


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