Será que a lei é a mesma para todos?

Cláudia Chaves Martins Jorge • 2 de dezembro de 2020

Por Cláudia Chaves Martins Jorge


A Constituição Federal, no artigo 133¹, dispõe que o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei. Para ser advogado, é preciso preencher alguns requisitos que estão previstos no Estatuto da OAB Lei 8906/94², art. 8º, dentre eles: graduação em Direito (em faculdade credenciada e reconhecida), aprovação no exame de ordem, idoneidade moral, não exercer atividade incompatível com a advocacia, além de prestar compromisso perante o conselho.


Ainda de acordo com o Estatuto da OAB, art. 31, o advogado deve proceder de forma que o torne merecedor de respeito e que contribua para o prestígio da classe e da advocacia e deve manter a independência em qualquer circunstância no exercício de sua profissão. E nem mesmo o medo de desagradar ao magistrado ou a qualquer autoridade deve detê-lo. Pois, o advogado deve ter consciência de que o Direito é um meio de mitigar as desigualdades para o encontro de soluções justas e que a lei é um instrumento para garantir a igualdade de todos, conforme disposto no art. 3º do Código de Ética e Disciplina da OAB³.


O advogado, o juiz e o promotor ocupam funções diferentes, mas a atividade jurisdicional não pode ser exercida, com efetividade, sem a participação de cada um deles. Não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos (art. 6º do Estatuto da OAB). No mesmo sentido, o Código de Ética da Magistratura dispõe no art. 22 que o magistrado tem o dever de cortesia para com os colegas, os membros do Ministério Público, os advogados, os servidores, as partes, as testemunhas e todos quantos se relacionem com a administração da Justiça.


Porém, apesar dos respectivos códigos de ética, ainda ocorrem verdadeiros absurdos, advogados são xingados e desrespeitados, inclusive em audiências, com ofensas pessoais e profissionais que jamais deveriam ocorrer4. Se não bastassem estas situações ofensivas e a morosidade do próprio sistema, o país e o mundo assistem, atônitos, as últimas ações do ex-juiz Sérgio Moro, que já havia comprometido sua imparcialidade e ferido a ética e a moral nas sentenças que proferiu à frente da Operação Lava Jato, quando aceitou ser Ministro da Justiça do governo Bolsonaro. Nem sempre os fins justificam os meios.


Sérgio Moro ganhou expressão ao ser o responsável pelos processo da Operação Lava Jato. De acordo com o Ministério Público Federal5 a operação “…. é a maior iniciativa de combate a corrupção e lavagem de dinheiro da história do Brasil. Iniciada em março de 2014, perante a Justiça Federal em Curitiba, a investigação já apresentou resultados eficientes, com a prisão e a responsabilização de pessoas de grande expressividade política e econômica, e recuperação de valores recordes para os cofres públicos.” Mas, todo aquele discurso de combate à corrupção caiu por terra pelo confronto de interesses pessoais e profissionais que ocasionaram o afastamento do procurador Deltan Dallagnol e a saída do Juiz Sérgio Moro para assumir um cargo político no governo que, de alguma forma, beneficiou-se das ações da força tarefa.


Centrada na pessoa do então Juiz Sérgio Francisco Moro e do Procurador Deltan Dallagnol, que fizeram parte da força tarefa no TRF4, a operação Lava Jato culminou na prisão do ex-presidente Lula e na “quebra” de grandes construtoras do país a Odebrecht, OAS e a Queiroz Galvão, abalando também a Petrobrás que, segundo o Ministério Público, foi vítima de um esquema criminoso envolvendo políticos, funcionários, operadores financeiros e as empreiteiras. Ironicamente, após sair bastante estremecido do governo Bolsonaro, o ex-juiz assume agora o cargo de Diretor na empresa de consultoria Alvarez & Marsal6, com sede nos Estados Unidos, que é justamente a responsável pela negociação das dívidas das Empresas atingidas pelos processos da Operação Lava Jato, onde ele mesmo era o juiz responsável, o que é claramente um conflito de interesses, mesmo porque, como juiz da causa, teve acesso a todas as informações e documentos, inclusive os sigilosos.


O Conselho Federal da OAB pediu esclarecimentos para saber qual será exatamente a função de Moro, e se tem relação com a advocacia e onde se dará a prestação do serviço7 De acordo com o art. 95, parágrafo único, V da Constituição Federal é vedado ao juiz exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos três anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneração. Porém, como é defendido por muitos juristas, inclusive pela Associação Nacional dos Magistrados do Brasil, ao dizer “juízo” deve-se entender “Vara ou Comarca” onde o Juiz atuava, ou seja, como o ex-juiz e ex-ministro não atuará especificamente em Curitiba, ele, em tese, não está ferindo o disposto no artigo. Apesar de não poder se falar que esta atitude é pautada na boa fé e muito menos na ética.


O ex-juiz se explicou pelo Twitter dizendo: “ingresso nos quadros da renomada empresa de consultoria internacional Alvarez&Marsal para ajudar as empresas a fazer coisa certa, com políticas de integridade e anticorrupção. Não é advocacia, nem atuarei em casos de potencial conflito de interesses.” Mas, independentemente do que irá fazer e do cargo ocupado, ele teve acesso a documentos e peculiaridades do caso como juiz da causa.


Enquanto isso, muitos advogados, sem informações privilegiadas e, às vezes, sem acesso até às informações necessárias à defesa de seus clientes, têm que entender o “Código de Processo” específico de cada Vara de atuação. E, vão lutando, a cada dia, para que seus processos sejam julgados com imparcialidade, dentro de um prazo “razoável” conforme previsto pelo Código de Processo Civil8, art. 4º, porque é atual a frase de Rui Barbosa de que a “Justiça tardia nada mais é do que injustiça institucionalizada”. A esta altura, ainda cabe a pergunta: a lei, de fato, é a mesma para todos? Esta referência encontra-se perdida numa crise, em meio a tantas disparidades.


Referências:


¹ http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

² http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8906.htm

3 https://www.oab.org.br/arquivos/resolucao-n-022015-ced-2030601765.pdf

4 https://www.youtube.com/watch?v=T1211DYs1Ms /  https://www.youtube.com/watch?v=su_4XzWBPrI / https://www.youtube.com/watch?v=32tKiCiR_bY

5 http://www.mpf.mp.br/grandes-casos/lava-jato/entenda-o-caso

6 https://www.alvarezandmarsal.com/our-people/sergio-moro

7 https://epoca.globo.com/guilherme-amado/conselho-federal-da-oab-vai-notificar-moro-sobre-natureza-de-seu-trabalho-1-24773454

8http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm

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