Projeto “Brasil - 200 anos do grito do Ipiranga”
No ano que comemoramos os 200 anos da Independência do Brasil, muitos foram os estudos e escritos revisionistas sobre a importância da data e a representação do povo brasileiro que a compõem. Historiadoras renomadas como Ana Flávia Magalhães, Hebe Mattos, juntaram seus questionamentos aos nossos, e em artigos e aulas publicadas onlines, como no blog, “Conversa de Historiadoras”, ambas, de forma coletiva, juntamente com Martha Abreu, Mônica Lima, Keila Grinberg e Giovana Xavier, escreveram em março de 2022, um texto abordando o evento do ano. De forma didática, elas, deram um pontapé inicial em questões como a invisibilidade da população negra, de seus percursos de lutas e conquistas, no caminhar desses 200 anos de autonomia da antiga colônia portuguesa.
O pensar do texto, iniciou um ano antes, a partir do planejamento e realização do curso que ocorreu no formato online, devido a pandemia e que ficou intitulado como “Emancipações e Pós-Abolição: Por Uma Outra História do Brasil (1808-2020)”. O referido curso composto por oito professoras/pesquisadoras, como as membras do blog acima citado, e mais as professoras Wlamyra Albuquerque e Ynaê Lopes.
E neste viés, novos ventos foram lançados para futuras análises do Brasil que queremos. Ao ser convidada para ministrar palestra sobre os 200 anos da Independência, na Câmara Municipal de Barbacena/MG, eu apresentei o texto Candendê, terras de Cativeiro, sonhos de liberdade, o qual, posteriormente, a convite da Rede de Historiadorxs Negrxs, foi publicado no Portal Geledés (https://www.geledes.org.br/candende-terras-de-cativeiro-e-de-sonhos-de-liberdade/). O texto numa intrigante conversa entre o passado e presente, narra as experiências de luta pela liberdade vivenciado por Quitéria, cativa ilegal, nos anos de 1837 e, a de Ana Cirilo, empregada doméstica dos anos 30 do século XX. Mulheres que apesar de terem vivido em tempos cronológicos e históricos diferentes, estavam presas, em formatos diferentes, ao sistema opressor “senhorial”.
A região dos Candendê, quando surge seu nome em documentos oficiais do século XIX, era composta por várias comunidades negras. Hoje, a região que teve o nome alterado para Distrito de Padre Brito, manteve-se na luta pela valorização de suas memórias de resistência, conquistando em 2012, a titulação da Fundação Palmares de terra dos remanescentes quilombolas do Candendê. Foi nestas paisagens de mata de cerrado mista à mata Atlântica, que Quitéria e Ana Cirilo, exerceram sua força de trabalho na mesma Fazenda da Conquista. A situação vivida por essas mulheres, em tempos distintos, mas que mostram uma continuidade de exploração, descaso, e inexistência de políticas públicas que busquem minimizar os danos causados pela escravidão na população negra do Brasil, que me instigou levar para as salas de aula, nossas indagações e incômodos acadêmicos. Assim, levar aos discentes de forma lúdica um debate sério, mas infanto-juvenil do país que construímos para o país que queremos, acabou-se tornando num projeto de produção de curta-metragem. O curta “Brasil: 200 anos do grito do Ipiranga”, produzido pelos alunos da turma 8.06 busca fazer uma reflexão sobre esse Brasil potente, que ainda silencia personagens importantes na sua construção e mascara fatos que deveriam ser debatidos. Numa brincadeira de viagem no tempo, pessoas narradas nas histórias oficiais do país, encontram-se com outros apagados dos livros de história oficial, mas que construíram e ainda constroem pontes para um país melhor.
O que pretendemos, foi fazer um paradoxo das várias histórias contadas nestes 200 anos. O que Quitéria, Ana Cirilo, Marielle Franco, Ailton Krenak e outros, diriam à Dom Pedro sobre o Brasil que temos? Como pensar um novo Brasil, contestando a visão oficial e militarizada da nação brasileira? O resultado da produção, que pode ser acessado no site
https://www.youtube.com/watch?v=MGZw4V0nuIA, foi singelo, mas didático, sendo um produto, que mostra as novas possibilidades metodológicas de trabalhar a disciplina de História. Nessa produção, os alunos são os protagonistas de seus conhecimentos e revelam as faces de um Brasil em construção.
Bibliografia
BITTENCOURT, V. L. N. De alteza real a imperador: o governo do príncipe D. Pedro, abril/1821-outubro/1822. São Paulo, 2007. Tese (Doutorado) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo.
CARVALHO, J. M. de; BASTOS, L.; BASILE, M. (Org.) Guerra Literária. Panfletos da Independência, 1820-1823. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2014. 4v.
FRANCHINI NETO, Hélio. Independência e morte: política e guerra na emancipação
do Brasil (1821-1823). 1. ed. Rio de Janeiro: Topbooks, 2019.
JANCSÓ, I. (Org.) Independência: história e historiografia. São Paulo: Hucitec; Fapesp, 2005.
Sites:
https://conversadehistoriadoras.com/2022/03/28/200-anos-de-um-pais-chamado-brasil-e-preciso-contar-outra-historia/ Acesso: 03 de março de 2023
http://numemunirio.org/em/site/Site/index.php Acesso: 03 de março de 2023
https://www.geledes.org.br/candende-terras-de-cativeiro-e-de-sonhos-de-liberdade/ Acesso: 03 de março de 2023.