O caso da menina de 10 anos, grávida em razão de um estupro – uma análise jurídica
Por Cláudia Chaves Martins Jorge
O Brasil viu e ouviu atônito a notícia de que uma menina de 10 anos havia engravidado vítima de estupro, praticado pelo tio. Porém, em mais uma violação ao direito desta criança, ela teve seu nome revelado em uma rede social, o que viola o disposto no artigo 5º da Constituição Federal que assegura a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, passando a ser alvo de ataques daqueles que se intitulam “defensores da vida”. No entanto, há que se questionar qual vida estão defendendo, pois uma criança de 10 anos não tem sequer estrutura física para gerar um filho, o que dirá estrutura emocional e psicológica.
Eu também defendo a vida, sou contra o aborto, para se evitar filhos, existem métodos anticonceptivos eficientes, para quem optar por usá-los, porém todas estas afirmações são válidas para pessoas com completo desenvolvimento mental, capazes de tomar decisões com base em discernimentos e não a uma criança que ainda está em formação. Não estou dizendo que a vida da menina tenha mais valor que a do nascituro, mas temos que ser razoáveis, com a gestação levada adiante, poderiam ser duas vidas perdidas. Defender a vida não é protestar, rotular ou agredir verbalmente, vai muito além disto, é buscar conhecer esta criança, onde e como ela vive e saber o que pode ser feito para ajudá-la já que, ao que parece, ela é criada pelos avós porque a mãe é andarilha.
O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) estabelece em seu artigo 4º que é: “É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.”
Sendo este o mesmo entendimento da Constituição Federal em seu artigo 227. Criticar, apontar e rotular não resolve o problema. Sejamos verdadeiros, suponhamos que esta criança não tivesse feito o aborto, quem dos que estavam lá protestando contra a menina, iria até ela ou à família para propor ajuda? O barulho e o grito não resolvem problemas sociais. Não se trata de uma caça às bruxas, uma criança de 10 anos não tem como ser responsabilizada porque ela é a vítima. Acusá-la é impor a ela a penalidade por um crime que não cometeu. Eu me pergunto, e o tio desta menina? O ato cometido por ele há anos não é reprovável? O abuso veio a ser descoberto em razão da gravidez desta criança, caso contrário, ela continuaria sendo vítima, sabe-se lá até quando já que esta situação se arrasta desde que ela tinha 06 anos.
O Código Penal estabelece que: “Art. 128 – Não se pune o aborto praticado por médico: II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.” No caso da menina, houve autorização judicial da Vara da Infância e Juventude da cidade de São Mateus/ES, depois de analisado o fato. Defender a vida é garantir que a infância não seja interrompida de forma tão violenta, a vida deu a esta criança um pesado fardo para carregar porque ela foi traída por um parente, da pior forma possível. Este caso provavelmente terá ainda desdobramentos, mas que este fardo possa ser dividido para que fique mais leve!!!