Os 131 anos da Proclamação da República e o papel dos militares no Governo Brasileiro.
Por Cláudia Chaves Martins Jorge
Em 15 de novembro de 1889 a Proclamação da República trouxe um novo viés para o Brasil colocando fim à Monarquia. O governo de Dom Pedro II iniciou oficialmente em 1840 quando, aos 14 anos de idade, por uma manobra política, foi-lhe antecipada a maioridade para que pudesse então governar o país. A Constituição Federal de 1824, vigente no reinado de Dom Pedro II, consagrou a divisão dos poderes em Executivo, Legislativo e Judiciário, incluiu o Poder Moderador, que, nos termos do artigo 101², concedia ao Imperador, “pessoa inviolável e sagrada” (art. 99²), a decisão final sobre todos os demais poderes.
Através do Poder Moderador, Dom Pedro II conseguiu impedir a participação dos militares em seu Segundo Reinado, que foi marcado por várias disputas de interesses, dentre elas, o fim da escravatura, que atingiu diretamente os cafeicultores, dando origem ao início da imigração. No entanto, o grande divisor de águas que culminou na decadência da Monarquia e o fortalecimento dos militares foi a Guerra do Paraguai, que teve início em 1864, com a invasão da província brasileira de Mato Grosso, e vencida pela tríplice aliança entre Brasil, Argentina e Uruguai após 5 anos de conflito³, com a morte do líder paraguaio Solano López pelas tropas brasileiras.
O Brasil estava mergulhado em dívidas por causa da guerra e, como dizem os historiadores, a República não foi proclamada, mas aclamada porque a Monarquia estava sendo vista como um sistema de governo atrasado4. O Marechal Deodoro da Fonseca, herói da Guerra do Paraguai, foi convencido por um grupo de republicanos liderado por Quintino Boicaiúva, fundador do Partido Republicano, a liderar o movimento ligado aos grandes cafeicultores da época que pretendiam chegar ao governo pela República. Em 15 de novembro de 1889, Marechal Deodoro disse na reunião com Quintino Bocaiúva e Benjamim Constant: “Façamos a República! Benjamin e eu cuidaremos da ação militar, Quintino e seus amigos organizarão o resto.5”
Marechal Deodoro foi então eleito Presidente do Brasil e governou o pais de fevereiro a novembro de 1891, ao renunciar, foi substituído pelo Marechal Floriano Peixoto, que ocupou a Presidência de 23/11/1891 a 15/11/1894. Prudente de Moraes foi o primeiro presidente eleito pelo voto, que excluía deste direito os menores de 21 anos, as mulheres, os analfabetos e os pobres. A presidência do Brasil chegou a ser ocupada algumas vezes por militares, mas em 1964, o Presidente civil João Goulart foi deposto em resposta à estreita relação do governo com frentes populares, cujos carros chefes eram a reforma agrária, econômica e social.
Durante o Regime Militar ocuparam a cadeira de Presidente: de 1964 a1967: Humberto Castello Branco; de 1967 a 1969: Marechal Costa e Silva; de1969 a 1974: General Emílio Médici; de 1974 a1979: General Ernesto Geisel e de1979 a 1985: General João Baptista Figueiredo que, durante seu mandato, deflagrou a campanha das Diretas Já6. (leia mais em https://www.lugardeopiniao.com.br/o-povo-brasileiro-ja-tem-uma-constituicao-a-constituicao-cidada/)
Em 31/08/2016, no segundo mandato da Presidente Dilma Rousseff, o Brasil se vê, pela segunda vez na história, com um impeachment de um presidente eleito7. Pela forma como o processo foi conduzido, não houve a cassação da chapa pelo TSE8 e o Vice-Presidente Michel Temer assumiu o cargo dando início a uma série de reformas que tirou vários direitos trabalhistas e previdenciários da população, mas, até aquele momento, não se via efetivamente uma participação ativa das Forças Armadas no Governo.
Com a campanha para Presidência de Jair Bolsonaro, pautada no discurso conservador de “não admitir ideologia de gênero nas escolas; incluir no currículo escolar as disciplinas educação moral e cívica (EMC) e organização social e política brasileira (OSPB), que eram ensinadas durante a ditadura militar; propor a diminuição do percentual de vagas para cotas raciais; ampliar o número de escolas militares; reformular o Estatuto do Desarmamento, e o direito à posse de arma de fogo por todos; reduzir a maioridade penal para 17 anos por emenda constitucional; criar uma nova carteira de trabalho verde e amarela, em que o contrato individual prevaleça sobre a CLT” ele acabou sendo eleito em 2018, tendo um militar da reserva como Vice-Presidente.
E mais uma vez na história, no governo Bolsonaro, se vê a participação efetiva de militares ocupando a maioria dos cargos de Ministro e tantos outros postos civis. Segundo uma reportagem da CNN Brasil9 datada de julho de 2020, o número de militares ocupando postos no Poder Executivo somava 6157 e a reportagem esclarece que se baseou em dados do TCU a que tiveram acesso. No entanto, não é este o papel das Forças Armadas. De acordo com a Constituição Federal9:
“Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.”
O governo, que acumula uma série de problemas, tem recebido muitas críticas, principalmente pela forma como lidou e ainda lida com a pandemia da Covid-19. Dono de uma fala desmedida, o Presidente coloca o país em situações de risco. Além das agressões verbais à imprensa e a todos os que ousam criticá-lo, o país se mostra frágil, mesmo estando aparentemente ligado às Forças Armadas.
No recente episódio, o Presidente Bolsonaro, ao se remeter aos EUA diz que “quando acaba a saliva, tem que ter pólvora”, o pais se vê em um embaraço diplomático, tendo em vista o Brasil ainda não ter parabenizado oficialmente o Presidente eleito dos EUA Joe Biden. O mais preocupante disto tudo, foi a fala do Comandante do Exército Eduardo Pujol, em uma “live” no dia 12/11/2020 do Instituto para Reforma das Relações entre Estado e Empresa10” ao afirmar que “o Exército brasileiro é um dos menores do mundo em relação ao nosso território e a nossa população” e ainda destacar que “estamos muito aquém do que o Brasil precisa.”
Apesar da expressa declaração de seu Comandante, de que não é interesse do Exército que a política entre nos quarteis, também endossada pelo Vice-Presidente da República, é indissociável a imagem do governo Bolsonaro ao Exército, que infelizmente sairá tão manchado em sua passagem pelo Governo, quanto o próprio Presidente, deixando para trás os dias de glória das Forças Armadas que sempre foram apontadas no topo de confiabilidade pelo país11.
Referências:
¹https://www.historiadomundo.com.br/idade-contemporanea/segundo-reinado-1840-1889
²http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao24.htm
³ historiadomundo.com.br/idade-contemporanea/segundo-reinado-1840-1889.htm
4https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2019-11/proclamacao-da-republica-completa-130-anos
5https://www.ebiografia.com/quintino_bocaiuva/
6https://www.camara.leg.br/noticias/93692-os-presidentes-da-ditadura-militar/
7https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2016/12/28/impeachment-de-dilma-rousseff-marca-ano-de-2016-no-congresso-e-no-brasil
8https://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2017/Junho/por-4-votos-a-3-plenario-do-tse-decide-pela-nao-cassacao-da-chapa-dilma-e-temer
9http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
10https://iree.org.br/comandante-pujol-militares-nao-querem-fazer-parte-da-politica/
11http://www.eb.mil.br/o-exercito?p_p_id=101&p_p_lifecycle=0&p_p_state=maximized&p_p_mode=view&_101_struts_action=%2Fasset_publisher%2Fview_content&_101_assetEntryId=6326740&_101_type=content&_101_urlTitle=pesquisa-aponta-as-forcas-armadas-no-todo-do-nivel-de-confianca-no-pais&inheritRedirect=true