Olhar de novo

Sidney Jorge • 23 de abril de 2025

Olhar de novo

     O fundamento de uma convivência saudável reside no respeito. Distante de uma postura de submissão, o respeito funciona como um convite a uma interação mais rica entre as pessoas, especialmente. Isso se estende também à maneira como respeitamos animais e plantas, uma expressão muito contemporânea. Desde cedo, aprendemos a valorizar nossos pais ou aqueles que se dedicam a cuidar de nós desde o nosso nascimento. O vínculo criado pelo alimento natural, como a amamentação, gera um sentimento de gratidão que é impulsionado pelo respeito. Essa parece ser uma reação natural, talvez realmente seja. No contexto da creche ou da escola, o respeito é fundamental para a interação com os colegas. Os educadores precisam estar preparados para guiar as crianças na formação de suas relações, compreendendo a relevância dos valores que trazem de casa. O exemplo torna-se ainda mais poderoso quando o respeito se reflete em atitudes e palavras. Mas, qual é a razão para refletirmos sobre o respeito?


     Diante de tantos avanços que permeiam a sociedade contemporânea, com uma infinidade de leis e informações, é como se estivéssemos imersos em uma era de desrespeito. Embora eu busque destacar os aspectos mais construtivos dessa temática, é imprescindível contextualizar a situação, o que nos leva a reconhecer a urgência de repensar o conceito de respeito. Certos padrões comportamentais revelam um real risco à ausência desse valor fundamental.


     Por exemplo: o, infelizmente, famoso ‘bullying’ representa uma decadência na sociedade, quando as maiores evidências se dão entre crianças e adolescentes, na escola ou não.


     A falta de paciência com as crianças. É verdade que há fatores psicológicos construídos hereditariamente que apontam para certa  incompreensão do desenvolvimento cognitivo delas. Assim, não se respeita nem o processo de desenvolvimento, tão pouco elas


     O desrespeito nas famílias. Quando permitimos que isso ocorresse? O mais preocupante é que se torna uma prática comum entre os parceiros. A construção de uma vida comunitária ou conjugal deve ser fundamentada nos princípios essenciais do respeito. Qual é o propósito, então? As violências, sejam físicas, sociais ou psicológicas, são consequências diretas dessa falta de respeito. Conflitos e crises podem surgir, mas devem ser enfrentados com respeito, o que demonstra verdadeira maturidade.


     Na convivência, a falta de respeito se apresenta como um grande desafio. Se alguém se torna um mero objeto, suas memórias, dores, alegrias, sonhos e conquistas tornam-se irrelevantes, pois a percepção nesse contexto é a de que essa pessoa existe unicamente para ser desrespeitada. Uma relação deve ser fundamentada no fluxo construtivo da partilha, e não em egocentrismos doentios que carecem do mínimo de empatia pela outra parte, independentemente de gênero, raça, cor ou idade. Não deveriam existir disputas, mas sim um companheirismo que permita avançar com confiança, dedicação e respeito mútuos.

 

     Ao observar as mídias sociais, a situação se complica. Não se sabe se as redes sociais levaram as pessoas a perder o respeito ou se o desrespeito já estava presente e se intensificou nelas. Referindo-se ao filme "A Rede Social", o Facebook nasceu exatamente de uma iniciativa que desconsiderou os colegas de faculdade. O “X”, antigo Twitter, é um caso à parte. É inegável que o contraditório é essencial para a construção do conhecimento, porém nem sempre o que se vê nas redes consiste em aprendizado. As reivindicações pela liberdade de expressão muitas vezes soam como um pedido para legitimar o desrespeito desenfreado, sem qualquer forma de moderação. Nas mídias, as pessoas expõem tudo, tanto o que deveria quanto o que não deveria ser compartilhado. Dado que os meios de comunicação sempre tiveram um papel significativo nos comportamentos humanos, essa situação é preocupante; as atitudes e linguagens disseminadas pelas mídias sociais refletem como se vive no cotidiano. Embora exista a possibilidade de compartilhar mensagens positivas, o desrespeito parece predominar em número. É tão absurdo que uma postagem agressiva e desrespeitosa pode fazer uma pessoa saltar de mil a milhões de seguidores em questão de minutos. Nota-se uma crise de princípios, valores e juízos, sem referências para educar e mediar as interações. Cada um age conforme sua própria lei, seu entendimento e sua moral fragmentada, desconectada de fundamentos mais universais que possam promover uma convivência harmoniosa.


     Quando se direciona o olhar para a política e os conflitos globais, a situação causa ainda mais espanto. A desumanização da identidade de um povo para legitimar o lançamento de uma bomba representa o mais grave exemplo de desrespeito pelo que é mais valioso para os seres humanos: a vida e, sem dúvida, o direito de existir. A mentalidade extremista de supremacia e a tentativa de impor uma cultura que é economicamente, socialmente e humanamente brutal, fundamentada em uma ideologia de seleção natural que prega que apenas os fortes devem sobreviver, pode ser ainda mais absurda. Isso jamais deveria servir como justificativa para desrespeitar as pessoas, especialmente aquelas que estão em situação de vulnerabilidade. A miséria não deixa de ser consequência desse pensamento distorcido. Uma mentalidade polarizada e subjetiva em relação ao verdadeiro significado da política tem se fundamentado no desprezo pela própria democracia, a ponto de agredir símbolos e, até mesmo, indivíduos.


     Perante essas reflexões sobre uma cultura do desrespeito, é fundamental destacar um elemento crucial: a ausência de respeito próprio, evidenciada pela falta de dedicação à compreensão e à construção do autorrespeito. Quando alguém deixa de se cuidar, alimentando-se de maneira inadequada, mesmo tendo possibilidades de se nutrir corretamente; optando frequentemente por ambientes que não favorecem seu crescimento; sucumbindo ao excesso de substâncias que prejudicam sua consciência, como bebidas alcoólicas, por exemplo; negligenciando sua saúde e a recuperação, caso necessário; afastando-se de atividades físicas, lazer e espiritualidade; e aceitando passivamente o desrespeito alheio. Não é preciso responder de forma agressiva, mas é essencial reconhecer como o respeito é benéfico em qualquer circunstância. Quando uma pessoa se submete a jornadas de trabalho excessivas sem a devida compensação, fica claro que a falta de consciência do respeito pode sustentar ideologias dominantes. Ao sacrificar noites de sono por jogos, televisão e outras distrações, e ao negligenciar o estudo, a leitura e a informação, a situação se agrava. Por exemplo, alguém que se respeita não entraria em um carro conduzido por um motorista claramente embriagado e, ao contrário, tentaria impedi-lo de continuar a viagem. Além disso, não concordaria em se deixar guiar por alguém com menos informações e sabedoria acerca da própria vida. O autorrespeito requer uma consciência clara, idealmente plena, da própria identidade, proporcionando assim as condições necessárias para uma vida saudável.


     E agora? Como podemos restabelecer ou, pelo menos, dar início a um diálogo em prol de uma vida pautada no respeito?


     A palavra respeito, em latim, origina-se de “respectus”, que significa olhar de novo. Essa expressão sugere uma alteração na perspectiva. Um novo olhar pode revelar aspectos ainda não percebidos e proporcionar uma nova compreensão da realidade. Para conseguir essa nova visão, pode ser imprescindível desconstruir preconceitos e ideologias errôneas, reconhecendo assim que tanto eu quanto o outro somos indivíduos dignos de respeito na construção de nossas histórias pessoais e universal.


     Olhar de novo, pode levar à reconstrução das próprias crenças, evidenciando que o respeito é fundamental e benéfico.

 

     Olhar de novo, pode abrir caminho para a criação de melhores combinações ou referências que, quando necessário, possibilitam    reorientar a convivência entre casais, pais, mães, filhos e filhas, vizinhos, vizinhas, cidadãos e cidadãs.


     Olhar de novo, pode inspirar uma admiração especial por pessoas, animais e plantas, especialmente em relação à biodiversidade.


     Olhar de novo, pode desestabilizar hierarquias, promovendo o respeito como a base das interações essenciais nas instituições.


     Olhar de novo, pode fomentar uma interação mais solidária entre as nações por meio de políticas inclusivas e que promovam a vida.


     Olhar de novo não significa aceitar tudo sem questionar, mas, ao menos, deixar de lado a discriminação e ofensas desnecessárias a outras pessoas.


     Olhar de novo é um ato de empatia, uma palavra que merece reflexão, e que nos leva a considerar as escolhas dos outros.


     Olhar de novo é a chance de oferecer ou receber um bom conselho.


     Olhar de novo serve para reorientar comportamentos, promovendo a consciência do autorrespeito. Quando a pessoa se depara com uma situação que pode ferir seu respeito, ela faz uma pausa, reflete e decide se deve seguir em frente ou não.


     Olhar de novo pode resultar em um aperto de mãos ou um abraço, sugerindo que estamos prontos para avançar, agora, com respeito, estimável respeito.


Por Sidney Jorge 9 de abril de 2025
Um poema para lembrar a importância dos amigos e amigas que se fazem pelo caminho.
Por Sidney Jorge 4 de abril de 2025
O que é a perfeição? Quem delimita a perfeição? A consciência da própria existência é uma capacidade que, de forma racional, pertence exclusivamente ao ser humano. Temos a habilidade de refletir sobre o passado, viver o presente e imaginar um futuro possível.
Por Sidney Jorge 7 de março de 2025
"Cada pessoa vê o mundo com aquilo que tem no coração."
Por Sidney Jorge 20 de fevereiro de 2025
Um sonho antigo sempre pairou sobre um lugar que é referência nas memórias de muitas pessoas. É o Campo do Oriente, localizado no Bairro Santa Efigênia, na cidade de Barbacena.
Por Sidney Jorge 19 de dezembro de 2024
Vejo o antigo mesclado ao contemporâneo, No Centro pulsante da cidade Caminhar traz um prazer instantâneo, Nesta pessoa a viver na meia idade.
Por Sidney Jorge 4 de novembro de 2024
Desejava ver um poeta, Não sabia aonde procurar, Fui à janela aberta E me pus a contemplar.
Por Sidney Jorge 9 de outubro de 2024
A palavra ver apresenta muitos significados. Como verbo, pode-se entendê-la como olhar, enxergar, mirar, observar, contemplar, mas como substantivo, o vocábulo adquire outros significados: opinião, entendimento,...
Por Sidney Jorge 12 de setembro de 2024
Um sábado à tarde. Feriado. Comemoração do chamado 7 de setembro, independência do Brasil. Celebra-se com apresentações de marchas militares e escolares. Alguns grupos aproveitam, também, para se reunirem...
Por Sidney Jorge 5 de agosto de 2024
Um dia desse encontrei o amor, Pairava acima da razão e um pouco abaixo da alegria,
Por Sidney Jorge 4 de junho de 2024
Uma poesia inspirada nas frases encontradas na porta de uma padaria no Bairro onde moro.
Mais Posts